quarta-feira, 4 de junho de 2008

O dia terminava complicado como se já não me bastasse os problemas financeiros, o frio me rachava os lábios e narinas internas onde meu coração acelerava se me provocava vontade de espirrar.
O caminho não foi acertado, por isso desci não em casa, mas próximo. Tudo bem pois já sabia o caminho. Pensei que até me faria bem, tomar aquela brisa gelada no rosto.
Pensei que sim por estar muito bem agasalhado, por ter acabado de consumir algo quente e degustante.
Como sempre fazendo juz ao meu ego.
Até topar com um simples ser. Simples na altura por ser pequena; simples nas formas por ser uma criança, simples nas roupas por serem poucas. Aquela expressão desde aquele dia rezo para que nunca mais a veja pela minha vida à frente.
Eu não sou de olhar para os lados. Ao caminhar, geralmente ponho algo na cabeça (ou nos ouvidos) que não me fazem prestar atenção, mal ao trânsito. Nessa noite foi diferente. Tive azar. Será?
Aquele rosto me trouxe lembranças familiares. Por isso me senti tão comovido ao ponto de parar e ouvir o que ele tinha a me dizer.
As sandálias de dedos nos pés sob aquele chão de 14º centígrados me fizeram traçar um emaranhado de sentimentos e sensações.
Ao ouvir aquelas poucas palavras pronunciadas com dificuldade pela gagueira acentuada, meu peito só acelerava. Por um segundo pude sair do meu corpo e ver aquela cena de um outro ângulo. Me vi agasalhado, com todas as mordormias que um cara de dezenove anos pode ansiar em frente a uma criança que não devia ter mal uma cama ou uma refeição decente todos os dias. Pedi com fé por ele e agradeci em meu nome.
A cada palavra enfim pronunciada meu coração se partia mais. Ao final pode então entender que precisara de um quarto de um real para comprar um pacote de biscoitos.
Na minha ânsia não dei um, nem três, mas dez vezes mais o que ele tinha me pedido. E ao fim pedi que fosse para casa. Na minha talvez igenuidade de acreditar que ele tivesse um lar.
Aquilo não me amenizou nenhum pouco. Mas em pensar que eu estava triste por não ter encontrado as coisas que eu queria comprar, ou por meus cartões de crédito (no plural mesmo) terem dado defeitos, resolvi calar a boca e agradecer por ter sido somente isso.
Ao final desse pensamento, prestes a atravessar a rua uma senhora idosa, com uma bengala na mão esquerda me chama a atenção. Ela me chama e me diz uma frase que me deixara com aquela vontade inconsciente de responder em retruco: -como?
Ela me disse; -Você o ajudou a comprar drogas.
-Como? -eu retruquei querendo não acreditar.
-Eu moro neste local e o conheço há anos e sempre o vejo fazendo isso.
Neste momento senti-me nu. Senti-me a pior pessoa que se pode imaginar. Senti-me tendo colaborado para que aquele pequeno menino morresse.
Disse então: -Senhora eu não sabia. Ele me foi tocante e eu não sabia o que fazer. Me perdoe.
O olhar daquela senhora me fez por entendido.
Ao voltar a caminhar meus olhos se enchiam e ficavam um pouco menos vermelhos que o meu nariz.
Olhares acompanhavam o meu soluçar pelas ruas. O meu endereço parecia mais distante quanto mais insistia em chorar. Quanto mais insistia em parar.
Mal conseguia abrir a porta. Joguei minhas coisas na cama com cuidado para não acordar meu irmão que dormia na cama ao lado. Tomei meus cigarros e abri a janela sem medo do frio. Não mais prendia o choro... a dor era tamanha que me fizera chorar por quase quarenta minutos. Pensava que por minha culpa aquele garotinho não teria as mesmas chances que eu tive. Nem as perspectivas, sonhos... eu destrui uma vida e eu não sabia como lidar com isso. Não tinha naquele momento nenhum tipo de consolo. Nem a fumaça do meu cigarro eu conseguia ver.
Meu coração partiu. Eu não sabia o que fazer a não ser chorar.
De repente o celular acusou alguém. Era um amigo que me chamara ao seu encontro para uma despedida. Ao chegar ao seu encontro, depois de lhe contar tudo ganhei um abraços e palavras que me fizeram acalmar-me o peito. Não esqueci de nada do que me aconteceu. Mas por um momento pude ficar mais calmo até poder respirar normalmente.


HuG

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